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O PROCESSO, O JULGAMENTO E A JUSTIÇA
Ponto de Vista

O PROCESSO, O JULGAMENTO E A JUSTIÇA

Este artigo escrito e publicado em Agosto de 2004, demonstra o que o Advogado Amadeu vem dizendo. Não digo, taxativamente, o mesmo porque não sou Advogado, mas que há algumas plantas daninhas nos Tribunais que precisam ser removidas isso, as há...

No jornal “A Semana” número 653, de 19 de Março deste ano, numa carta do leitor por mim assinada dei a conhecer aos cidadãos, em sinal de desabafo, o percurso de um processo sumário transformado em processo “SUMARA” devido ao tempo em que esteve a dormir na secretária do Senhor Juiz e o comportamento pouco cortês por parte daquela individualidade.

Talvez motivado pelo conteúdo daquele artigo, com uma pedra na algibeira, o mesmo Juiz marcou o dia para julgamento, para o qual, deduzo, foram notificadas todas as pessoas arroladas no processo. O Autor, na circunstância o subscritor deste artigo, as testemunhas e o seu patrono compareceram, enquanto que da parte do Réu, apenas a sua Advogada.

Abro um parêntese para informar os leitores que não tiveram a oportunidade de ler o artigo acima referido, de que o processo em referência adveio na sequência de um sortudo que ocupou, como inquilino um cidadão português, o rés-do-chão do prédio de que sou proprietário, utilizando-o como residência, oficina e loja, e quando resolveu sair, fê-lo sem pagar um mês de renda, sem pintar, sem colocar lâmpadas fluorescentes fundidas, sem refazer um guarda fato por ele arrebentada e transformada em armazém, sem ao menos varrer o chão e retirar das paredes, inclusive em azulejos, 127 pregos por ele colocados, tudo isto agravado com uma dívida por pagar à Electra de trinta e oito mil escudos.

Para dar cumprimento ao que recorrentemente se vem dizendo que ninguém deve fazer justiça com as suas próprias mãos e sendo eu também um ninguém, dirigi-me ao Tribunal, solicitando justiça.

No dia do julgamento, o Meritíssimo Juiz Dr. Jaime Miranda depois de inquirir as minhas testemunhas presentes e ao tomar conhecimento de que apesar de todo o tempo decorrido desde a data da entrada da petição inicial e a do julgamento, dezanove meses, os trabalhos de reparação dos danos ainda não estavam feitos por indisponibilidade financeira do Autor, estranha o facto de eu não ter realizado os trabalhos, disse: “Sendo o Senhor um homem cheio de dinheiro, devia já realizar os trabalhos necessários. Toda a gente sabe que o senhor tem muito dinheiro, e se não fez os trabalhos é porque não quis”. Enquanto proferia aquelas palavras, fazia gestos impróprios para alguém que detém tamanha responsabilidade, o que nem Juizes do extinto Tribunal Popular praticavam durante julgamento. Esses comentários e gestos, na minha opinião, não dignificam a impressiva Beca usada pelos senhores administradores da justiça, mormente quando feitos em pleno julgamento. Mas, se há pessoas de muita testa, muito papel, muito “power” e pouco “xintido,” que fazer?

Deve ser por causa dessa desnecessária avaliação de que eu sou “homem cheio de dinheiro”, que o levou a propor, incompreensivelmente, durante a audiência preparatória, que eu aceitasse, em sinal de conciliação, apenas 25% do valor da causa, desempenhando as funções da Advogada do Réu.

Porque as testemunhas doutra parte não se fizeram representar, ele adiou o julgamento para outra data, o que embora possa ser legal, poderá, de alguma forma, beneficiar alguém que não o subscritor, quanto mais não seja para aliciar falsas testemunhas.

No dia aprazado para o segundo julgamento, da parte do Réu, apenas compareceu a sua Advogada e quanto às testemunhas, de novo, nem fumo nem mandado. Eu sabia que não haviam nunca de comparecer tão simplesmente porque não as possuía, pois era para irem dizer que foi o rendeiro quem pintou o espaço na altura da sua ocupação, e já que não era verdade sabia que ninguém se iria dizer tamanha mentira na presença do Juiz

Pelo contrário, e disso o Meritíssimo deve ter experiência suficiente que, da forma como os cidadãos, sobretudo os iletrados, têm medo do Tribunal, ninguém ousaria faltar a um julgamento duas vezes consecutivas sem razões ponderosas e justificadas. Essas ausências, na minha opinião, deveriam ser analisadas de forma diferente. Nessa audiência para esquecer – pois o comportamento do julgador, também desta vez, salvo o devido respeito que nutro por todos os magistrados e Juizes por achar muito nobres essas profissões – senti, confesso, alguma vergonha e pena daquele digníssimo Juiz por entender que ele pôs em causa sem necessidade aparente, a capacidade técnica do seu antecessor que deu procedência ao processo pois, disse:

“Este processo não tem valor nenhum, foi mal conduzido e se fosse eu a despachá-lo seria liminarmente rejeitado ab.Initio”, para ainda arrematar, “o Tribunal devia pedir outra avaliação, para certificar-se da veracidade do processo”. Tudo isso proferido num tom descontraído como se de Juiz ad-hoc se tratasse. Com efeito, tendo ele o mesmo processo que foi aceite pelo seu antecessor, no seu gabinete, durante quinze meses sem tomar conhecimento de todas as falhas apontadas, dá para deduzir, se não mesmo concluir que nunca o leu. A serem verdadeiras tais afirmações, embora desconheça os meandros a que os despachos judiciais devam obedecer, porque não usou o seu poder para o devolver à procedência ou ainda providenciar para uma nova avaliação, conforme achou ser dever do Tribunal, do estado do espaço ocupado pelo Réu? Acho que no momento em que o Juiz verifica a invalidade e a má condução de um determinado processo, deve agir em consequência, devolvendo-o à procedência com um indeferimento a tinta vermelha.

Efectivamente, um processo que entra na secretaria do Tribunal em 16 de Dezembro de 2002, vai para despacho e permanece no gabinete do Juiz que o despacha durante vários meses, até certa altura em que aquele despachante é chamado para outras funções e o substituto que ocupa o lugar, deixa-o no estado em que o encontrou, sem sequer ter a preocupação de o ler, durante mais quinze meses, nem mesmo se calhar ao dar o despacho saneador, quesitando as partes, pois, em o ter lido, não escarrapachava, entre o conjunto do conteúdo do despacho, dois parágrafos que me parecem cruéis para ele, já que catalogou o processo como sendo inválido e mal conduzido. Abaixo segue a transcrição dos referidos parágrafos. “O TRIBUNAL É COMPETENTE EM RAZÃO DE NACIONALIDADE, DE MATÉRIA E DE HIERARQUIA”. Mesmo com essa competência, não indefere o processo inválido! “O PROCESSO NÃO CONTÉM NULIDADES PRINCIPAIS NEM SECUNDÁRIAS QUE O INVALIDEM”. Quinze dias antes, o mesmo processo era, no seu juízo, inválido! Dá para entender?

Relativo a este processo “sem valor”e “mal conduzido”, o referido Juiz veio a proferir a sentença no passado dia 27 do mês de Julho, no qual teve outra percepção ao julgar parcialmente procedente a acção, deixando transparecer que, afinal, o processo não é o que afirmou durante o julgamento, tendo ilibado o R. do pagamento da renda em dívida,
sem uma única alínea justificando o porquê da decisão, ilibou-o do pagamento da dívida da água junto da Electra porque achou que não sou procurador e nem cobrador da Electra, papel que todos os proprietários têm sido obrigados a desempenhar até que a agência reguladora dessas actividades ponham cobro a essa situação. Várias outras coisas não foram tidas em conta não sei por que razão, pois no corpo da sentença não vem especificada, com o agravante de o Meritíssimo, um pouco distraído, na sentença que proferiu, disse: “O CUSTO DOS TRABALHOS PARA REPARAR AS REFERIDAS DETERIORAÇÕES FOI ORÇADO EM 217.250$00.”Não conseguiu descortinar que nesse total também está incluído o valor de setenta mil escudos, correspondente a um mês de renda por saldar, tendo, por isso, ignorado na sentença esse pormenor, ao não fazer menção dessa quantia e justificar o porquê da não responsabilização do Réu pelo seu pagamento. Mesmo o Réu não tendo apresentado uma única prova testemunhal e/ou documental foi a sua versão da contestação a mais válida, a ponto de, para além de lhe ser ilibado de muitas responsabilidades, as custas serem rachadas ao meio e cada parte uma metade. Se calhar porque não tem cara de quem falta a verdade. CIDADÃO PORTUGUÊS NÃO FALA MENTIRA!
Todos os documentos justificativos inclusive fotografias e recibos como suportes de prova apresentados pelo Autor, praticamente não foram tidos em conta, contrariamente ao crédito que os dizeres da contestação do Réu mereceram.

Decididamente, acho que – por uma razão que não consigo descortinar – esse Juiz não vai com a minha cara ou com a minha “tamanhura”. “If not”, vejamos:

Na década de 90, dei entrada no Tribunal um processo contra uma companhia de seguros, por incumprimento de contrato, tendo ele recebido e despachado o processo

Passado algum tempo, manda-me chamar para me perguntar o que queria com aquele processo que mais parecia “salada russa” e que não entendia nada daquilo, ao que retorqui: “Este processo é para reclamar um direito que me assiste e foi feito por um Advogado desta praça, experiente, solicitado e gabado”, pelo que seria conveniente falar com ele, porque, apesar de ter um cheirinho de justiça, de lei não entendo nem para matar a sede.

Provavelmente não gostou da minha sugestão, fez-me sinal de estar já despachado e remata: “Eu não vou mexer neste processo”. Saí e fiquei à espera. Só que de facto não mexeu nele até seguir para outro poiso, para só depois de sete anos vir a ser julgado por um outro colega, que se calhar usou todos os óculos que as universidades distribuem ou então que possui uma visão mais apurada, para descodificar e identificar cada fruta da “salada russa,” tendo, por isso, feito o julgamento e proferido a sentença da qual saí ressarcido dos danos causados, tudo com juros e correcção monetária.

Passados estes dias em que estive a matutar – a ver se descubro as razões da atitude hostil do referido Juiz para comigo – deduzo que deve ser ciúme desta minha “excessiva riqueza” e “xatiamento” com a minha militância no PAICV, e, ainda, querer proteger o cidadão português

Em virtude do valor da acção do processo não ser passível de recurso, desabafo junto da opinião pública.

Praia, 5 de Agosto de 2004


P.S. Na altura em que saiu a sentença, o dito cujo já se encontrava evaporado. CONLUIO COM O JULGADOR?

Cabo-verdianamente,

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Redação