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Um olhar sobre a regionalização. Estar atento para evitarmos cair na primeira armadilha
Colunista

Um olhar sobre a regionalização. Estar atento para evitarmos cair na primeira armadilha

CONCEITO DE REGIONALZIAÇÃO

A Regionalização é um processo que visa a constituição ou instituição e transformação de unidades ou entidades territoriais concretas que são as regiões. Essas regiões teriam a missão de exercer as competências decorrentes das atribuições que lhe forem conferidas.

MODELOS DE REGIONALIZAÇÃO

Podemos elencar três modelos de Regionalização:

Regionalização política:  as regiões têm autonomia político – legislativa em matérias de interesse especifico da região. «Regiões autónomas»

Regionalização administrativa: as regiões dispõem apenas de autonomia administrativa e de poderes de caracter regulamentar, sendo que a decisão politica caberá ao Governo e ao Parlamento. As regiões administrativas são autarquias locais tais como as camaras municipais e funcionam como uma autarquia de coordenação supra e intermunicipal. «Regiões administrativas»

Regionalização - plano: as regiões-plano são espaços de articulação entre o governo, e outras entidades locais, que mediante comissões de coordenação regional, visam criar dinâmicas de desenvolvimento regional. Essas comissões estariam sob a orientação do Governo central. «Regiões - Plano»

CRITÉRIOS E DELIMITAÇÃO

Os critérios de delimitação são diversificados. É o exemplo do critério da homogeneidade, havendo possibilidade de agregação territorial a partir das semelhanças de fenómenos físicos, demográficos, históricos, sociais e

culturais. Outro critério pode ser a funcionalidade – complementaridade: que agrega numa mesma região áreas que pela sua interdependia justificam um procedimento conjunto face as ações de desenvolvimento.

Alerta-se para o facto de “as excessivas individualizações das regiões, em elevado número e de características dimensionais restritas, traduzem numa excessiva pulverização de meios e constituem sérios obstáculos à coordenação. Por outro lado, as exageradas dimensões acarretam problemas de gestão do território e inconvenientes nas populações respectivas”. Criar regiões tem custos e tem riscos. Uns e outros aumentam com a quantidade que se criar.

PÓS E CONTRAS /VANTAGENS E DESVANTAGENS

Qualquer processo de Regionalização sugere, para ser sério, a necessidade de pesar prós e contras, os aspetos positivos e negativos.

As criticas que normalmente são apontadas a criação de regiões são:

  • dimensão demasiada reduzida do país;
  • insuficiente heterogeneidade interna do ponto de vista sócio-cultural
  • tradição de municipalismo
  • risco de conflitualidade social, de debilitação da coesão nacional e de burocratização
  • susceptibilidade de conflitos de actuação entre as entidades
  • custo elevado para as finanças publicas e supervisão de um novo aparato burocrático
  • clientelismo e caciquismo

Como objetivos elegíveis para justificar a regionalização costuma-se apontar:

  • redução do peso da administração central
  • combate às disparidades regionais, estimulando o desenvolvimento mais equilibrado do território
  • melhor aderência de politicas e programas à diversidade do país
  • maior eficiência na tomada de decisões públicas e na administração e ordenamento do território
  • enriquecimento da democracia pela via da descentralização.
  • melhora os níveis de participação dos cidadãos e da sua proximidade às instâncias do poder
  • potenciação de identidades regionais

“Se as criticas podem ser passiveis de rebater ou minimizar, ou assumidos como riscos que valeriam a pena correr, as virtudes apontadas pressupõem relações de casualidade que estão por provar, constituindo a criação de regiões administrativas, quanto muito, condição necessária, mas não suficiente para que elas ocorram”.

UM OLHAR SOBRE CABO VERDE

Atualmente a estrutura político-administrativa do país está organizada em dois níveis: central (com governo e administrações desconcen­tradas) e o local, com os Municípios.

No que diz respeito à organização territorial - administrativa, em 1975, havia 13 concelhos, tendo passado para 17 em 2000 e em fevereiro de 2005 foi aprovado a lei de criação de mais 5 municípios, passando para 22.

A questão que emerge é a possibilidade de criar juridicamente uma instância intermédia entre o nível do estado e dos municípios e qual a sua autonomia e que formas de legitimação politica deveria ter essa instância intermedia.

As Regiões autónomas serão as entidades intermédias mais adequadas para Cabo Verde?  Creio que a Regionalização politica não é o caminho, e seria fazer um divisionismo passivo, um acantonamento das ilhas sem utilidade para o progresso, re­forço da coesão e da competitividade nacional, para além de esvaziar o princípio basilar da unidade do Estado. Cabo Verde é um Estado micro e ultraperiférico. Um território pequeno, com reduzida população e tem uma tradição de unidade politica cujo grau de heterogeneidade cultural não justifica a necessidade de regiões autónomas.

Por outro lado, uma proposta de regionalização administrativa faria sentido num quadro diferente do que temos hoje ou no mínimo acompanhada de  ampla reforma territorial, para evitar conflitos e desperdícios. Pelo que há que ir muito mais além do que, juntar ao que já existe, uma outra estrutura. A gestão de recursos (que já são poucos), as dificuldades de articulação e ainda da sobreposição de competências e conflitualidade tenderão a agravar.

A proposta apresentada pelo MPD não serve os interesses do país porque representa sobrecarga financeira e desperdício e por não apresentar todos os aspetos de um verdadeiro processo de reforma administrativa territorial, que é o que Cabo Verde precisa.

Portanto, não me convence a ideia de uma regionalização administrativa na actual conjuntura. Temos que ir reforçando o municipalismo, a desconcentração e descentralização administrativa, num cenário passível de ser equacionado de agregação de entidades territoriais já existentes como é o caso dos municípios para ganharem escala acompanhado da criação de autarquias inframunicipais.

“A descentralização de funções do Estado não é, nem deverá nunca ser vista como um fim, mas como um caminho que nos levará a uma administração territorial mais eficiente”. Não pode haver pressas, a transição deve ser prudente, olhando para todos os lados. Pressas para quê? Para servir clientelismos políti­cos, interesses partidários ou pessoais de caciques ou demagogos?

Concluo, dizendo que, não nos podemos iludir pelo engano vestido de eloquência e arte, dos que pretendem usar a regionalização para distrair a população e sobretudo dos que se dizem temerosos do excesso do poder central, mas que ao mesmo tempo apresen­tam soluções armadilhadas, próprios de grupos de interesse ávidos por novas fontes de poder, querendo deixar na sua santa cruzada inconsequente um legado desastroso às futuras gerações.

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SOBRE O AUTOR

Carlos Tavares