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Saúde. Deficiente abastecimento de água impede diminuição do paludismo
Sociedade

Saúde. Deficiente abastecimento de água impede diminuição do paludismo

O diretor do Programa de Luta contra o Paludismo de Cabo Verde defendeu que os riscos da doença no país diminuiriam significativamente se o abastecimento de água à população fosse contínuo, pois deixariam de ser usados reservatórios inapropriados.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) confirmou há cerca de um ano a existência de um surto de paludismo (malária) por Plasmodium falciparum na cidade da Praia, Ilha de Santiago, o qual infetou 420 pessoas e provocou um morto.

Contudo, o país está sem casos de paludismo desde o início do ano, tendo-se registado alguns casos suspeitos que foram despistados, sem confirmação da infeção, revelou António Moreira, em declarações à Lusa.

Há vários meses que estão no terreno medidas de prevenção, como a campanha de pulverização, para eliminar a concentração de mosquitos, cuja primeira fase vai entrar na última semana. Em setembro, entrará em vigor a segunda fase que permitirá uma proteção anual.

Os grandes aliados dos mosquitos que transmitem o paludismo e outras doenças - como o dengue e o Zika - são alguns dos hábitos que se registam em Cabo Verde, resultado da escassez, nomeadamente, de água.

António Moreira acredita que se o acesso à água fosse possível 24 horas por dia as populações não teriam necessidade de ter reservatórios para guardar água, os quais estão geralmente destapados e são um habitat para os mosquitos transmissores de doenças.

Mas esta não é a única dificuldade com que se depara quem luta contra o paludismo. Em algumas casas, as caves estão fechadas e cheias de água proveniente dos lençóis freáticos. No andar superior vivem famílias que nem sempre comunicam a presença da água nas caves e nem sempre estão disponíveis para o seu tratamento.

O mesmo acontece em vários terrenos onde se pratica a agricultura local. Os lavradores guardam os depósitos de água mal-acondicionados e convidativos para os vetores. E também tem sido junto deles que as autoridades se têm desdobrado em ações de sensibilização.

A tarefa não é fácil, como reconhece António Moreira. Alguns moradores não aceitam a presença dos pulverizadores nas suas casas ou não estão disponíveis para as tarefas preparatórias que a medida implica, como a proteção dos mobiliários, a retirada atempada dos animais ou a manutenção da casa fechada algumas horas após a aplicação do produto.

Daí a insistência na sensibilização da população para a necessidade desta medida, uma vez que em muitos casos o primeiro impulso é para recusar, com a alegação de que não existem mosquitos na casa, quando às vezes esta é um foco de infeção.

Ainda assim, e segundo António Moreira, 60 a 70% da população da cidade da Praia, que foi atingida pelo surto no ano passado e é a principal preocupação das autoridades devido ao volume de entradas e saídas, está protegida através da pulverização.

Prestes a terminar esta primeira fase da campanha, cerca de 80 por cento dos bairros já foram pulverizados, devendo a meta preconizada pela OMS, de 85%, ser atingida na próxima semana.

Segundo António Moreira, existirão sempre locais onde estas ações não atingem semelhantes percentagens, como o centro histórico, que é composto essencialmente de estabelecimentos comerciais.

O surto do ano passado permitiu algumas lições e levou a algumas mudanças e investimentos, como a antecipação da época da pulverização, que começava em junho e julho e este ano começou em maio: “Fazíamos [a pulverização] nas zonas nobres de risco e agora fazemos uma pulverização massiva. Melhorámos em termos do transporte, com várias viaturas para a mobilidade dos agentes, o que facilita a deslocação aos bairros. Temos mais equipamentos e bombas de pulverização e os funcionários estão mais bem preparados e equipados”.

O despiste e o tratamento do paludismo é gratuito, existindo material “em todos os hospitais”, disse ainda.

António Moreira acredita que as medidas estão a dar resultados, como o demonstra a ausência de casos, nomeadamente naqueles locais que durante anos foram de maior risco e que, após intervenção, não tiveram mais casos durante o surto de 2017.

Este trabalho, acrescentou, só é possível mobilizando gente de várias áreas e que atua de uma forma descentralizada.

“Elaborámos um plano multissetorial de luta contra todos os vetores, não só contra o paludismo. Cada vetor tem o seu habitat e meio de transmissão e, perante isso, delineámos as nossas estratégias. Trabalhámos durante todo o ano e reforçámos sobretudo na época pré, durante e pós chuva”, afirmou.

Ainda assim, as autoridades têm sido surpreendidas com novos aliados dos mosquitos, como o aparecimento pontual de plantações de arrozais entre arbustos, os quais representam possíveis focos de infeção.

As plantações são destruídas e os seus proprietários, sobretudo elementos da cada vez maior comunidade chinesa em Cabo Verde, são esclarecidos sobre os riscos. Quando confrontados com o esclarecimento, acatam a decisão.

Este ano, a luta contra o paludismo contou ainda com o aproveitamento de ladrões que, fazendo-se passar por pulverizadores, entraram indevidamente em pelo menos duas residências para as assaltar.

Com Lusa

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